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Na infância a vida eram glóbulos de luz...
Alegria diáfana e multicolorida.
Na adolescência era uma casa soturna
eu me escondia nos sótãos e alçapões
e só saía para respirar quando os fantasmas
tinham ido embora.
Hoje todo dia me aproximo mais do lugar onde
meu corpo deixará de existir pelas chamas,
preso numa carreta e exposto às pedradas, cuspes
e palavrões: bruxo! relapso! ingrato!
Dia a dia posso ver melhor a clareira onde
se dará a ecpirose.
A procissão segue e estas vozes e estas névoas
não cessam de falar e falar sempre a mesma coisa...
tratam-me como se me conhecessem, mas nunca
as vi. Julgam-me com extrema facilidade, e me condenam
pelo que fiz e não fiz. Não tento retorquir, é inútil.
Guardo minha existência com cuidado, não desperdiço.
São crianças, adultos, velhos, homens, mulheres, animais,
deuses, planetas, símbolos, idéias puras intocáveis.
Minhas correntes pesam o mundo, minha jaula carrega
o supérfluo de mim.
Se quiser, venha você também seguir este lúgubre desfile.
(mas cuidado para não ser pisoteado, esmagado pelas rodas
da carroça, ou detido como herege, também)
(mas cuidado para não ser pisoteado, esmagado pelas rodas
da carroça, ou detido como herege, também)

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